Olá, leitora. Olá, leitor. Tudo bem?
Neste 20 de agosto, dona Anna Lins do Guimarães Peixoto Bretas, ou simplesmente Cora Coralina, faria aniversário.
E, se você acompanha essa newsletter há algum tempo, já sabe que todo mês de agosto eu falo dela. E sempre acho pouco, tenho uma vontade imensa de que todo mundo a leia.
Acredito que o meu apego a ela não esteja somente nos belos poemas. Sinto que também tem a ver com a maturidade que Cora Coralina sempre trouxe para seus escritos. Palavras contundentes, mesmo para fosse para falar de um simples pedregulho, reflexões de uma mulher vivida, sábia, conhecedora do seu tempo, das agruras da vida. Acho que é isso me encanta. Porque, na verdade, a maturidade nas mulheres me encanta cada vez mais.
A menina Anna Lins, mais tarde a doceira dona Aninha, e depois nossa Cora Coralina, que publicou seu primeiro livro quando tinha 76 anos, nos encantando com sua prosa e poesia.
Cora Coralina publicou seu primeiro livro quando estava prestes a completar 76 anos, quer prova maior de maturidade e coragem? Embora desde adolescente já escrevesse e publicasse alguns poemas em jornais da cidade de Goiás, onde nasceu, a vida fez com que ela deixasse seus escritos de lado, aos 22 anos, para se casar. Para acompanhar o marido, já grávida, viaja a cavalo de Goiás até Jaboticabal, em São Paulo. Ali, torna-se dona de casa e tem seis filhos.
Deixa de escrever por décadas: o casamento a afasta de sua escrita e de Goiás por 45 anos.
Viúva, passa a trabalhar em diversas atividades, inclusive vendendo livros para a Editora José Olympio. Até que, em 1956, volta exatamente para a mesma casa onde passara a infância – a casa da ponte, eternizada em seus escritos, e onde inicia uma nova atividade, a de doceira.
A beleza não acontecerá somente no conteúdo dos imensos tachos caramelizados. Foi naquela cozinha, cheirando a doce 24 horas por dia, que nasceu a maioria de seus versos. É entre as panelas que ela volta a escrever. É ali também que decide assumir o pseudônimo com o qual assinaria seus poemas para sempre: Cora Coralina.
Primeiro livro de Cora Coralina, publicado quando ela tinha quase 76 anos, apesar de escrever desde a adolescência. A esquerda, capa da primeira edição, publicada pela José Olympio.
Já doceira de mão cheia, é em 1965 que resolve publicar seu primeiro livro: Poemas dos becos de Goiás e estórias mais. É neste livro que encontramos um de seus mais belos poemas: Todas as vidas. Nele, ela nos dá a dimensão exata de sua percepção da potência da mulher, amalgamando-se em todas elas, uma linha que permeará toda a sua obra.
Onze anos depois da primeira edição de Poemas dos Becos de Goiás e estórias mais, ela publicaria Meu Livro de Cordel. E em 1983, lança Vintém de Cobre - Meias Confissões de Aninha.
Aconteceu que, nesse meio tempo, uma edição de Poemas dos Becos de Goiás e estórias mais foi publicada pela Universidade Federal de Goiás. E, para nossa sorte, acabou chegando às mãos do poeta Carlos Drummond de Andrade. Ele ficou tão encantado com os versos de Cora, que escreveu e publicou em sua coluna uma carta para ela, reproduzida aqui:
Pronto! As palavras e a admiração de Drummond levam a poesia de Cora Coralina para fronteiras além Goiás, além Brasil. Ela passa a ser reconhecida. Tinha então 90 anos.
A partir daí, sua produção literária não parou mais. Ela escreveu poemas, contos, crônicas, publicou outros livros, foi eleita intelectual do ano em 1983 e contemplada com o Prêmio Juca Pato da União Brasileira dos Escritores. No mesmo ano recebeu o título de Doutora Honoris Causa da Universidade Federal de Goiás. Tornou-se um dos maiores nomes da prosa e poesia brasileiras.
A Casa Velha da Ponte
Tive o privilégio de visitar a casa da ponte, hoje Museu Casa Cora Coralina. Uma casa de amplas janelas, à beira do Rio Vermelho, de onde Cora tirou inspiração para tantos poemas sobre as lavadeiras que ali trabalhavam diariamente.
Ao entrar na casa, com o coração aos pulos, me deparei com o cenário do seu cotidiano: sobre o fogão à lenha estavam os tachos nos quais fazia doces; a bengala encostada na poltrona onde costumava sentar-se e, acima, um quadro com uma foto dela como que nos convidando a entrar; a máquina de escrever sobre a mesinha de seu quarto (sim, ela foi aprender datilografia aos setenta anos, para poder enviar seus escritos datilografados aos editores). E paredes repletas de poemas!
Um do que cobrem as paredes foi dedicado a Maria Grampinho, figura folclórica da cidade, que ia para a casa velha da ponte só para dormir. Andarilha pelas ruas da cidade, prendia em sua roupa tudo o que encontrava pela frente como plásticos, retalhos e botões velhos. Também usava muitos grampos no cabelo e, por isso, ganhou o apelido. Cora a recebeu em sua casa por 26 anos e escreveu um longo poema sobre ela, publicado no livro Vintém de Cobre. Abaixo, só um pequeno trecho do que li em uma das paredes do Museu:
Para encerrar
Espero que esta News tenha te estimulado a ler Cora Coralina. Eu poderia falar dos meus poemas preferidos, mas são muitos. Enfim, há muita coisa publicada com a comovente, rica e profunda escrita de dona Aninha.
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Até semana que vem
Viva a dona Aninha!